Mudanças climáticas e a intensificação do vulcanismo: Um desafio crescente no aquecimento global

Pesquisas recentes apontam para uma conexão profunda e ainda pouco compreendida entre mudanças climáticas e a atividade vulcânica, indicando que até mesmo alterações climáticas relativamente pequenas podem afetar a frequência e a intensidade das erupções. Um caso emblemático que desperta atenção global é o Monte Agung, em Bali, cuja recente atividade obrigou milhares de pessoas a evacuarem suas casas enquanto cinzas e magma eram expelidos da montanha. Para os balineses, o vulcão é uma entidade sagrada, e suas explosões são interpretadas como mensagens divinas. Para cientistas, no entanto, a atividade de Agung é parte do funcionamento natural da Terra, embora novas evidências indiquem que o aquecimento global possa desempenhar um papel crucial na intensificação do vulcanismo. Historicamente, os cientistas já haviam identificado um vínculo entre grandes transições climáticas e vulcanismo. Durante eras glaciais, por exemplo, quando geleiras se expandiram significativamente, a atividade vulcânica pareceu diminuir. O contrário foi observado durante períodos interglaciais, marcados pelo derretimento das geleiras. No entanto, um novo estudo publicado na Geology revela algo mais surpreendente: mesmo mudanças climáticas modestas podem influenciar o comportamento vulcânico.
Essa descoberta sugere que o aquecimento global causado pela ação humana pode levar a mais erupções e, potencialmente, a eventos mais intensos. Para entender melhor essa dinâmica, os pesquisadores analisaram registros vulcânicos da Islândia, um dos locais mais vulcanicamente ativos do mundo, durante um período de 5.500 a 4.500 anos atrás. Naquela época, o clima esfriou levemente, o que levou à expansão das geleiras islandesas, embora sem configurar uma era glacial completa. Para reconstruir a linha do tempo das erupções, os cientistas cruzaram informações de camadas de cinzas vulcânicas encontradas em turfeiras e lagos europeus com registros de vulcões na Islândia. Essa abordagem detalhada permitiu identificar padrões precisos de aumento e redução da atividade vulcânica ao longo de séculos. Os resultados foram claros: durante períodos mais frios, quando as geleiras se expandiram, a quantidade de erupções caiu significativamente. Essa redução na atividade vulcânica foi observada com um atraso de aproximadamente 600 anos em relação ao avanço do gelo. Esse intervalo se deve ao tempo necessário para que as geleiras acumulassem massa suficiente para exercer pressão sobre a crosta terrestre. Segundo Graeme Swindles, autor do estudo e professor associado da Universidade de Leeds, o peso do gelo age como uma espécie de tampa sobre o magma, dificultando sua propagação até a superfície. Quando as temperaturas aumentam e as geleiras começam a derreter, essa pressão diminui, permitindo que o magma se mova mais livremente, o que resulta em mais erupções. Outro dado interessante do estudo é que as erupções ocorridas durante períodos de maior cobertura de gelo tendem a ser menos intensas. Já em períodos mais quentes, marcados pelo derretimento das geleiras, as erupções são mais vigorosas. Após o resfriamento estudado, a Islândia passou por um novo período de aquecimento, que coincidiu com um aumento considerável na atividade vulcânica. O intervalo entre o derretimento do gelo e o aumento das erupções foi mais curto do que o observado durante o avanço das geleiras, pois o derretimento ocorre de forma relativamente mais rápida. Essas descobertas reforçam a ideia de que o aquecimento global moderno pode acelerar os ciclos vulcânicos. A Islândia, com sua geologia singular, é particularmente sensível a essas mudanças, mas não é o único local que deve ser observado com atenção. Swindles e sua equipe destacam que regiões como o noroeste do Pacífico nos Estados Unidos, o sul da América do Sul e até partes da Antártida podem enfrentar riscos semelhantes à medida que as mudanças climáticas alteram a dinâmica entre gelo e vulcanismo. Além das implicações científicas, há preocupações práticas relacionadas ao impacto do aumento da atividade vulcânica. Cinzas expelidas durante erupções podem causar sérios problemas para a saúde humana, como doenças respiratórias, além de afetar negativamente a agricultura e interromper operações de transporte, especialmente o tráfego aéreo. Eventos como a erupção do Eyjafjallajökull, na Islândia, em 2010, mostraram como as cinzas vulcânicas podem paralisar o transporte aéreo em escala continental. “Esses efeitos podem ser devastadores e precisam ser levados em consideração em nossas estratégias de adaptação às mudanças climáticas”, alerta Swindles. A relação entre mudanças climáticas e vulcanismo ainda não é completamente compreendida, mas a ciência avança para desvendar os mecanismos subjacentes. Swindles explica que, quando geleiras se expandem, o peso acumulado exerce uma pressão tremenda sobre a crosta terrestre, reduzindo a mobilidade do magma e alterando as falhas por onde ele flui para a superfície. Em contraste, quando as geleiras derretem, a diminuição dessa pressão cria condições que favorecem a propagação do magma e aumentam a probabilidade de erupções. Embora o estudo tenha se concentrado em mudanças climáticas naturais do passado, ele oferece insights importantes sobre os desafios futuros. As mudanças na cobertura glacial analisadas pela equipe são comparáveis em magnitude ao que o planeta enfrenta atualmente devido ao aquecimento causado por atividades humanas. “Podemos prever que haverá mais atividade vulcânica em áreas onde geleiras e vulcões interagem”, afirma Swindles. À medida que o planeta continua a aquecer, é fundamental monitorar essas regiões vulneráveis para antecipar os impactos e mitigar os danos. O aumento da atividade vulcânica não é apenas uma questão científica, mas também uma preocupação prática e econômica, com implicações para comunidades locais, sistemas de transporte e ecossistemas. Compreender as complexas interações entre clima e vulcanismo será essencial para lidar com os desafios de um mundo em rápida transformação. Graeme T. Swindles, Elizabeth J. Watson, Ivan P. Savov, Ian T. Lawson, Anja Schmidt, Andrew Hooper, Claire L. Cooper, Charles B. Connor, Manuel Gloor, Jonathan L. Carrivick; Climatic control on Icelandic volcanic activity during the mid-Holocene. Geology 2017;; 46 (1): 47–50. doi: https://doi.org/10.1130/G39633.1

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