As fezes, frequentemente desprezadas como mero resíduo, desempenham um papel surpreendentemente importante no ciclo alimentar de muitas espécies. Segundo uma revisão publicada em dezembro de 2024 na revista Animal Behaviour, este material não é apenas o último estágio da digestão, mas também pode ser uma fonte essencial de nutrientes, consumida novamente por diversos vertebrados. A coprofagia — termo que descreve o consumo de fezes — foi documentada em mais de 150 espécies, incluindo desde ursos negros adultos até coalas bebês.
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| Imagem de Holger Detje por Pixabay |
Uma das principais funções da coprofagia é a transferência de microrganismos essenciais para o intestino dos filhotes. Muitos animais jovens, como tartarugas do deserto, avestruzes e coalas, consomem as fezes de suas mães para obter bactérias necessárias ao seu sistema digestivo. Esta adaptação é vital para a sobrevivência de diversas espécies e é apenas uma das razões para a reciclagem de refeições previamente consumidas. Pesquisadores descobriram que, para muitas espécies, o consumo de fezes é indispensável. Por exemplo, pikas dependem do cocô de iaques para sobreviver aos rigorosos invernos, enquanto peixes-caverna contam com o guano de morcegos como principal fonte de alimento.
A coprofagia também é essencial para pequenos animais
herbívoros, como coelhos, cujas dietas ricas em plantas exigem soluções
digestivas inovadoras. Diferentemente de vacas, que possuem estômagos
compartimentados, esses animais reaproveitam fezes para extrair nutrientes que
não foram absorvidos na primeira passagem pelo sistema digestivo. Nesse
processo, uma parte especializada do
intestino produz fezes macias e ricas em nutrientes, frequentemente consumidas
diretamente do ânus pelo animal. Capivaras, por exemplo, demonstram
comportamentos similares a posições de ioga enquanto alcançam as fezes para se
alimentar.
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| Imagem de makieni777 por Pixabay |
Pais de algumas espécies também recorrem à coprofagia como parte dos cuidados parentais. Andorinhões e ursos negros, por exemplo, ingerem fezes durante o cuidado com filhotes, seja por razões sanitárias, seja como uma fonte de nutrientes. Este comportamento é especialmente comum em situações em que os pais estão isolados ou têm acesso limitado a alimentos externos.
Embora a coprofagia humana não seja abordada na revisão citada
anteriormente no texto, outro trabalho explorou suas implicações em um estudo
publicado na International Medical Journal. Ele observou que elementos
fecais foram usados em medicamentos tradicionais e, mais recentemente, na
medicina ocidental para tratamentos intestinais que utilizam microrganismos
fecais. No entanto, esses procedimentos geralmente envolvem implantes ao estilo
de colonoscopia, em vez de consumo oral. A coprofagia ilustra como muitos
animais desenvolveram soluções adaptativas criativas para sobreviver em
ambientes desafiadores.
Referências
- E.J. Power, S.L. Bornbusch and
E.L. Kendrick. Faeces as food: a framework for adaptive nutritional
coprophagy in vertebrates. Animal Behaviour. Vol. 218,
December 2024, p. 75. doi: 10.1016/j.anbehav.2024.09.0002
- S. Sri Kantha. Coprophagy types
in humans classified: A proposal. International Medical Journal.
Vol. 28, December 2021, p. 676.
- M. Polotzek et al. Behaviour
indicative of coprophagy in zoo-managed porcupine (Hystrix indica).
Mammalian Biology. Vol. 103, September 8, 2023, p. 633. doi:
10.1007/s42991-023-00376-1


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